segunda-feira, 27 de março de 2017

Johnny Alf, a celebração da modéstia

Por FERNANDO LICHTI BARROS


A missa de sétimo dia da morte de Johnny Alf teve o jeito dos oitenta anos de vida de Johnny Alf. 

Março de 2010. Enquanto no começo da noite a cidade ruge lá fora, no interior da igreja da Consolação, em São Paulo, um ritual modesto celebrava a partida do pianista, cantor e compositor. 

Missa parecida com ele: tranquila. Nenhum estardalhaço, nenhuma presença daquelas que costumam parar o trânsito, fazer espocar flashes, levar tietes ao delírio. Pouca nota, como diriam os colegas ali presentes. 

Havia partido o "Músico Simples" poeticamente retratado por Gilberto Gil na canção que Johnny gravou no LP "Nós", em 1974. O mesmo Johnny que na década de 50 impulsionou a música brasileira com "Rapaz de Bem" e, abraçado ao desprendimento, seguiu em frente  apresentando-se em boates, em bares, em pequenos shows. Ele gostava da noite. 

Autor, entre tantas outras belezas, de "Eu e a brisa", "Ilusão à toda" e "Céu e mar", Johnny morreu sem grana. Durante a missa na Consolação, o padre falou sobre injustiças cometidas por um mercado apenas voraz. 

Diante do altar, um rapaz de longa cabeleira rasta abriu os braços em cruz, rezou o Pai Nosso e foi embora, em passos lentos e silenciosos.

                                

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sexta-feira, 17 de março de 2017

Mestre Gabriel

Foto: Thiago Beatriz

Por FERNANDO LICHTI BARROS

Gabriel Bahlis escapou de doença, de acidente de automóvel, de garrafas que voavam durante cenas de pancadaria em boate e de ovos atirados num salão de baile enquanto tocava inadvertidamente o Hino do Corinthians diante de uma furibunda plateia de palmeirenses.

Por 28 anos trabalhou na Jazz Sinfônica, até, aos 84, ser desligado da orquestra. Não lhe foi perdoado o fato de ter envelhecido. Pobres moços.

Desde 1940 a música faz parte da vida de Gabriel. A formosa tia Marina, ex-miss Porto Alegre, tinha um piano na sala de casa. Ele tirou dali as primeiras notas. Depois tentou o violino, trocado pelo pandeiro ao integrar-se ao regional da Rádio Farroupilha. Foi o contrabaixo, porém, o instrumente que abraçou para não mais largar.


Em 1952 já se apresentava com o quinteto de Breno Sauer no Castelo Rosa, a tal boate das garrafas aladas. Em 1958, após uma temporada em Curitiba, desembarcou em São Paulo com o conjunto de Sauer, contratado pela boate La Vie en Rose. Tornou-se uma referência do contrabaixo brasileiro.

Walter Wanderley, Os Cincopados, Waldir Azevedo, Frank Sinatra, Herbie Mann, Cesar Mariano, Irmãs Galvão, Dick Farney, Sylvio Mazzuca, Dick Farney, Milionário e José Rico, Alceu Valença, Milton Nascimento, Gal Costa, Ednardo, Mazzaropi, Chacrinha  – vai longe a lista de artistas de diferentes estilos que tiveram a companhia de Gabriel em shows e gravações.

Não guardou registros da sua trajetória - nenhum recorte de jornal, nenhum LP, nem mesmo as medalhas conquistadas na juventude em campeonatos de natação. Só o que está preservado é o sotaque gaúcho.

- O que interessa, guri, é o teu interior, é fazer o bem pra todo mundo, é estudar, tocar. Anel, brilhante, automóvel... Quando se envelhece, nada disso interessa.


Gabriel, um mestre.



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Breno Sauer - Viva O Samba - 1959 - Full Album - YouTube

https://www.youtube.com/watch?v=Rl0JdU6EwcY